24 de fevereiro de 2009



Fantasias...

Junto-me à multidão dos aflitos,
Fantasiados do brilho da ilusão,
Assim podemos soltar os gritos,
Sem culpa, sem dar explicação...

Enfeito-me, como tantos, da cor
Que a mentira leva no disfarce,
Misturando no riso a mesma dor
Escorrido o ano todo pela face...

E quando esse povo se dispersa...
Ao som do silêncio do tamborim,
Meu lado solitário quer conversa...

Repreende o meu juízo sem jeito...
E da purpurina que ficou em mim
Salpica estrelas sobre meu leito!

Telma Moreira

21 de fevereiro de 2009



É carnaval...

Teria eu guardado,
Alguma fantasia
Que tenha sobrado
De qualquer alegoria
Do meu passado?

Só vejo no fundo
Do armário vazio,
Um traje imundo
De mofo e de frio,
Do tempo oriundo...

Deixo-o às traças
Da tola lembrança...
São fúteis fumaças
De veste esperança,
Bordando pirraças...

Cubro-me do nada,
Enfeito-me do riso,
Na máscara pintada...
Confetes ora piso,
Pra nua ser levada...

Telma Moreira

30 de janeiro de 2009


DEPOIS DO AMOR...

Enquanto repousas
Sobre meu corpo saciado,
Percorro teu corpo suado
Com dedos leves e toques sutis
A te agradecer por ser tão feliz!

Enquanto madornas,
Sinto tua respiração ardente
E as batidas de teu coração cadente...
Então, te digo coisas que não ouves
E te falo de sonhos que nunca soubes...

Enquanto descansas...
Depois de nosso amor louco,
Forte e suave, de tudo um pouco,
Satisfeita e agradada, desperta proponho...
E no beijo te enalteço, te amo, te sonho!

Enquanto viajas,
Entre o prazer e o cansaço,
Cuido de ti e te envolvo em meus braços...
Sorrio das lágrimas, te faço poesia,
Na espera que a noite possa ver o dia...

E, enquanto tu vais...
Eu fico! Mas, não sós...
Corpo e alma não se separam jamais!
Quando partes, me leva contigo...
E, quando não vou... ficas comigo!

Telma Moreira

27 de janeiro de 2009

DESVIO
Telma Moreira


Hoje amanheci em chuva...
Acordei em pedaços,
C’alma em dores,
Sem almejar espaços...
E transcorri em fios as horas,
Sem encontrar abrigos,
Nem discernir amigos,
Que me fizesse afagos...
Vem a noite, o dia vai...
E o anseio de findar meus ais...
Desmaiar de beijos,
Adormecer em desejos...
Um chamego, um apreço,
Qualquer coisa ao fim do dia,
Que afugente a nostalgia,
Do solitário corpo...
Ah, quem dera... nada muda!
Enquanto a vida impede
Meu coração de sorrir...
Derramo a dor do peito,
Ajeito o cabelo desfeito,
Limpo as cinzas do cinzeiro,
Vou me arrumar... e sair!

EROTISMO
Telma Moreira


Cobre-se do rubro no corpo ardente...
Em leito escuro, solitário e quente,
Onde fez-se noite e madrugada
E o sono esperado não tem morada...

As mãos indóceis percorrem inábeis...
Nos desejos insanos e inconfessáveis
A tocar a pele e os contornos tensos...
Ouvindo silêncio e palpitar imensos!

Contorcida em ritmo brando e lento,
Num turbilhão de sentir e de vontade...
Incesto, querer fazer amor com a saudade...

Na luta contra esse demônio hilário...
Não há anjos quaisquer que lhe deem alento
E já, leve-a ao êxtase, o macho imaginário!


VÉSPERA
Telma Moreira


Quem é você...
que rodeia meu bloqueio e remexe em minha rotina?
Quem é você...
que insiste em satisfazer desejos já não sonhados?
Quem é você...
que invade meu mundo de muros derrubados?
Quem é você...
que persiste em roubar meu tempo de sono escasso?...

Há muito ando perdida e não me procuro mais!
E você vem querendo despertar a parte que dorme, acordada...
Há tanto de mistério em você, em mim, nesse encontro...
Você chega para fazer ressurgir o medo...
Um medo inexplicável, imenso, insensato, absurdo...
O medo de reagir...de ser...ou de querer...
Um medo infindo de ousar...
E você, quem será?...

TRIBUTO À MINHA MÃE!
Telma Moreira


Toca... e toca seu pé, a costureira,
No pedal de sua máquina penhorada...
Até que as peças formem uma montoeira
De tons e cores, por sobre a bancada...

Balança os pés, em ritmo tão igual
Que as pernas doem e a vista cansa,
Parecendo sofrer de algum mal...
Embora sua vontade não descansa...

E quando a entrega lhe imputa
O pagamento de míseras moedas...
Ainda lhe resta o sorriso da melancolia...

Por bendita ser esta labuta,
Que lhe benzem o pão de cada dia...
E garante a escola de cada filha!

ESCULTURA
Telma Moreira


És estátua talhada em cedro nobre...
Tens a forma solitária de mulher...
Moldada e gravada pelo artista pobre...
Que sonha na vida o que quer!

Trazes esculpida em teus traços...
A imaginação fértil do seu criador...
Tens beleza dos pés aos braços...
Retratada por obra de um sonhador...

Apaixonei-me por ti...estatueta!
E ver-te assim, tão perfeita...
Provocaste inconfessável inveja...

Por perpetuaste em tua nua imagem
Sensualidade, audácia, coragem...
Aos olhos de quem te veja!